No primeiro livro de R. F. Franco, Nossas pálpebras , o poeta deslinda o que se pode chamar de pedagogia do olhar, coando, de imagens fotográficas, as palavras entranhadas nos cantos emudecidos do mundo. Em seu novo livro, Casas geraes , R. F. Franco olha em derredor e sente que é hora de voltar. De voltar-se. A voz do poeta agora reverbera em si. Não sai a pé pelas ruas, não entra num automóvel, não toma o trem que já não há. A estação do passado é ruína. O poeta de nossas pálpebras, no entanto, sabe fechar os olhos para descortinar a memória, essa construtora pertinaz que escolhe os tijolos mais bem cozidos para as paredes de uma casa que não existe mais. Casas geraes é um livro que se quer teto, estendendo-se até quebrar a linha da individualidade, horizonte cindido numa cidade que se funda no alicerce da palavra lembrança, com seus bairros a perder de vista, sítios e fazendas de pastos sem fim, as cercas farpadas de sentimentos, demarcando os campos de uma recordação transbordada em outros quintais outras águas outros chãos . Ao percorrer os cômodos e arredores dessas tantas casas, o leitor entra em sua própria residência, subitamente desconhecida. A avó, o pai, Lurdinha, Tiãozinho, Zica, uma procissão de estranhos de repente sendo a família de quem passeia pelas páginas do livro. O susto inusitado da poesia? Há na obra, ainda, um desejo de se recuperar a casa para além da memória. A arte seria o instrumento desse resgate. O poeta, entretanto, sabe demarcar os limites da empreitada. A poesia que soergue a casa também a esconde sob o peso dos versos. Nesse sentido, os espelhos que se dependuram pelas estrofes são passagens e reflexão questionadora do tempo e das obras, sejam elas barro ou palavras. A métrica da casa, portanto, estabelecida pelos tijolos aprumados em sua argamassa, na verdade reconstrói suas paredes de sonho e sombras na alma do poeta. Grande poesia rimada de contínuas impossibilidades. Na casa da infância, o menino se perde no espelho. A construção se desmorona em rugas de um estranho tão próximo. Estranho que é também o leitor, conviva e anfitrião, ao mesmo tempo, de um livro delicado e belo. Não há que se resistir a tal convite. Entre, amigo leitor. A casa é nossa. Antonio Geraldo Figueiredo Ferreira
- Autores: AUTOR: F. FRANCO, RENDRIK
- Editora: ILUMINURAS
- ISBN: 9788573215083
- Páginas: 80