Esta é uma História da Química inteligível não apenas para químicos. Concebemos esta História da Química como parte da História da Ciência como um todo, e esta por sua vez como parte integrante da história cultural da Humanidade. Pretendemos deliberadamente afastar-nos da visão internalista da História da Ciência, sem, contudo, aderir abertamente à visão externalista : a primeira nos daria uma História da Química que só outros químicos entenderiam, mas a segunda deixaria de considerar muitos aspectos químicos, valorizando excessivamente, em detrimento da Ciência, os aspectos filosóficos, históricos e sociais relacionados ao desenvolvimento da Química. Optamos, como aliás o fazem muitos historiadores da Ciência, por um meio-termo entre as duas concepções, mostrando a evolução da Química no contexto externo no qual tal evolução ocorreu. Além de considerarmos esta postura como a mais adequada, pois nenhuma Ciência é uma ilha de conhecimento, uma abordagem da História da Química nestes moldes a tornará interessante para os químicos (afinal historiam-se fatos e teorias químicas) e para os não-químicos (pois mostra-se a Química integrando um universo mais amplo).
Nesta História da Química os diversos assuntos abordados, relatados ou discutidos não o foram de maneira exaustiva, porém de maneira suficientemente ampla para uma abordagem abrangente da evolução do pensamento químico. Embora o autor não abra mão de expor, sempre que o julgasse necessário, sua visão pessoal sobre determinado assunto, isto é feito sem impor à redação do livro uma filosofia, uma ideologia ou uma concepção de Ciência da qual o leitor deva compartilhar.
Em assim fazendo, o autor deixa explícita sua posição face a temas como a Alquimia, o Flogístico, a Afinidade, e muitos outros, sem querer provocar uma ruptura com a historiografia corrente, que de certa forma reflete nosso tempo. Para que o fenômeno cultural "Química" pudesse ser visto da maneira mais universal possível, não limitamos nossas fontes historiográficas aos autores franceses, ingleses e norte-americanos mais costumeiramente citados, mas incluímos trabalhos de autores brasileiros e portugueses, espanhóis e latino-americanos, alemães, suíços, italianos, escandinavos, russos : temos nós, que vivemos e atuamos num país situado na periferia da atividade científica, a vantagem de abarcar o todo com uma mentalidade mais isenta e descompromissada. Sempre que acessíveis, recorremos às fontes primárias. De qualquer forma entende o autor que está preenchendo uma lacuna na historiografia da Ciência em língua portuguesa, apresentando um texto rico em informações mas também em discussões, controvérsias e aberturas para novas incursões pela Química como atividade humanística e cultural.
É preciso também que fique claro que o historiador não deve ser juiz: não podemos julgar épocas pregressas com argumentos de nossa própria época: as antigas teorias e conceitos devem ser entendidos e explicados no contexto no qual foram criados. Contrariamente a muitas histórias da Química recentes e menos recentes e dedicamos muito espaço à Química anterior a Lavoisier. Para tanto foi preciso, no nosso entender, fazer uma concessão ao moderno e fugir um pouco do contexto de cada época : representamos quase sempre as reações e transformações químicas como o fazemos hoje, para podermos entender o que de fato acontece nestas reações, e para podermos estabelecer as conexões com a Química posterior a Lavoisier. A inclusão e discussão mais detalhada da Química anterior a Lavoisier nos parece imprescindível dentro de nossa concepção de que no pensamento químico há muito mais uma Evolução do que Revoluções.
Esperamos ter mostrado que a Química vai além dos tubos de ensaio e dos equipamentos complicados, tendo seu lado humanístico e cultural, entendidos Humanismo e Cultura de forma mais abrangente. A cultura de um povo é uma mescla de sua cultura literária, artística, humanística e científica, e esperamos que esta "História da Química", da maneira como foi planejada, possa contribuir para integrar à nossa cultura a cultura científica, pois ao contrário de Letras, Artes e Humanidades, a Ciência ainda nos faz falta na América Latina.
Finalmente, sabemos que nem todos concordarão com todas as interpretações e pontos de vista aqui apresentados, mas é justamente na diversidade de opiniões que reside a garantia da crescente reflexão e investigação referentes aos temas apresentados, muitos de abordagem ainda incipiente, acrescentando-lhes novos dados e aprofundando seu entendimento.
Juergen Heinrich Maar, do Prefácio
- Autores: AUTOR: MAAR, JUERGEN HEINRICH
- Editora: DO AUTOR
- ISBN: 9788560826261
- Páginas: 946